terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Novo Cinema Coreano: ousadia que vem da Ásia


A projeção econômica e cultural da Coréia do Sul é um fato. Isto pode ser claramente comprovado quando lembramos de duas fortes marcas genuinamente coreanas: a K-Pop (a música pop local), cujo astro maior é Psy, e a gigante da tecnologia Samsung. Mas, esta invasão coreana também se dá no campo do Cinema. É crescente a presença de filmes e cineastas sul-coreanos nos principais festivais internacionais de cinema. O Ocidente abriu as portas para a produção cinematográfica da Coréia do Sul, que, graças ao talento, a criatividade e a ousadia dos seus realizadores assume a posição invejável de bola da vez no cenário do cinema mundial. A grande visibilidade e exposição das produções já foi captada pelo radar de Hollywood, que se movimenta para seduzir os principais cineastas para filmar na terra do Tio Sam.

Neste típico movimento de canibalismo de cinematografias internacionais, Hollywood importa diretores e roteiros. Alguns dos filmes de maior êxito do cinema sul-coreano recente estão sendo refilmados nos Estados Unidos, com elenco e diretores norte-americanos. Um exemplo é o recente remake de Old Boy, que foi realizado por Spike Lee. A versão original, dirigida por Park Chan-wook, faz parte da chamada “Trilogia da Vingança”, da qual trataremos mais logo adiante. O próprio Chan-wook já teve uma passagem recente pelos Estados Unidos, onde dirigiu Segredos de Sangue (Stoker), com Nicole Kidman no elenco.


Além de Park Chan-wook (talvez o cineasta coreano mais celebrado da atualidade), outros dois realizadores asiáticos também se aproximaram de Hollywood. Um deles é Kim Jee-woon, que dirigiu Arnold Schwarzenegger e o brasileiro Rodrigo Santoro no filme de ação O Último Desafio (The Last Stand). O outro é Joo-ho Bong, que realizou a ficção científica Expresso do Amanhã (Snowpiercer), com elenco norte-americano: Jamie Bell e Chris Evans (o Capitão América).

Então, fica a questão: por que o cinema coreano está atraindo tanta atenção e interesse? Possivelmente o ponto de virada nessa história tenha ocorrido no Festival de Cannes de 2004. Naquele ano o júri, presidido por Quentin Tarantino (um entusiasta do cinema asiático / oriental), foi tomado de assalto pelo impactante Old Boy, uma visceral história de vingança narrada com estilo, brutalidade, poesia e violência. Uma receita incomum, mas que, quando conduzida com talento, resulta em obras de referência, que marcam seu tempo. Agraciado com o Grande Prêmio do Júri de Cannes, Old Boy era o segundo filme da “Trilogia da Vingança”.

Trilogia da Vingança

A cinematografia coreana dos anos 2000 seduziu público e crítica no Ocidente por sua ousadia estética e a criatividade dos roteiros. Grande parte deste frisson foi provocada pela “Trilogia da Vingança”, dirigida por Park Chan-wook, composta pelos filmes Mr. Vingança (Sympathy for Mr. Vengeance, 2002); Old Boy (Old Boy, 2003) e Lady Vingança (Sympathy for Lady Vengeance, 2005). Nestes trabalhos o cineasta confirma as razões pelas quais é chamado de “Tarantino asiático”. Cineasta de perfil cult e pop, nos três filmes Chan-wook evidencia sua peculiar forma de contar histórias de violência e vingança, com muito estilo e surpresas constantes no ritmo da narrativa e na trajetória dos personagens. Os três filmes não tem relação alguma entre seus universos. São histórias distintas, porém, com um tema comum: a vingança. De diferentes formas, por diferentes razões e diversos personagens, a vingança é a força que move seus protagonistas.

O apelo ao humor negro e o bizarro por vezes marca presença, onde a violência extremamente gráfica convive com momentos contemplativos. Tudo num ritmo que por vezes provoca estranhamento e desconforto no espectador.


O primeiro capítulo da trilogia é Mr. Vingança que narra a história de um jovem surdo-mudo, que cuida da irmã, que precisa de um transplante de rim. Após ser demitido e enganado, decide sequestrar a filha do ex-patrão. Mas nem tudo sai como o planejado. Um acidente fatal provoca uma reviravolta. No terceiro ato a história que muda de ponto de vista, e o protagonista passa a ser o pai (ex-patrão do jovem) que assume uma missão de vingança pessoal, que desencadeará uma espiral de sangue e violência.


A história de Old Boy, segundo capítulo da trilogia, inicia em 1988, quando o personagem central, casado, pai de uma garotinha de três anos, é preso por 15 anos, por razões desconhecidas. Inclusive por ele próprio. Sem contato com o mundo exterior, sua vida entra em parafuso. Certo dia, de surpresa, ele é libertado. Sem rumo e desorientado, sua única forma de entender o mundo é buscar os responsáveis por sua prisão. Nesta busca se defrontará com uma terrível revelação.


Fechando a trilogia está Lady Vingança. Como o próprio nome indica, desta vez a protagonista é uma mulher. No caso, uma jovem de 19 anos que foi condenada a 13 anos de prisão pelo sequestro e assassinato de um menino de seis anos. Após sair da cadeia ela coloca em prática seu plano de vingança contra o verdadeiro culpado pelo assassinato da criança. Mais uma vez, no terceiro ato do filme Park Chan-wook nos oferece um banho de sangue.

Embora os três filmes não tenham uma relação maior entre si, o fato é que eles formam um poderoso painel da violência que é inerente ao ser humano. Narrados com muito estilo e criatividade, os filmes da trilogia reforçam o prestígio que o cinema da Coréia do Sul vem conquistando nos últimos anos. Então, fica a dica: se você quer conhecer um cinema vigoroso, que sai do lugar comum, e surpreende a cada sequência, a Trilogia da Vingança é a indicação.

Outros destaques do cinema coreano:

Ji-woon Kim:A Tale of Two Sisters; I Saw the Devil; The Good, the Bad and the Weirde; O Gosto da Vingança (A bittersweet life).

Kim-ki Duk: Primavera, Verão, Outono, Inverno e Primavera; Casa Vazia; Time: O Amor Contra a Passagem do Tempo.

Chang-dong Lee: Peppermint Candy; Oasis; Secret Sunshine; Poesia.

Hong-jin Na: O Caçador (The Chaser); The Yellow Sea.

Joon-ho Bong: Barking Dogs Never Bite; Memórias de um Assassino; Mother: A Busca pela Verdade; O Hospedeiro.

(Texto originalmente publicado no portal "Facool" em fevereiro de 2014)


Jorge Ghiorzi

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