quinta-feira, 3 de agosto de 2017

“O Filme da Minha Vida”: memórias de cinema


Terceiro longa-metragem dirigido por Selton Mello, O Filme da Minha Vida chega às telas confirmando as virtudes e os vícios do realizador, que demonstra especial predileção por histórias minimalistas centradas em personagens sufocados por crises pessoais, narradas com sensibilidade e apuro técnico. Assim como em O Palhaço, lançado em 2011, mais uma vez a figura do pai volta a ocupar importante papel na dramaturgia da história. A coincidência foi meramente circunstancial tendo em vista que o próprio autor da obra original, o escritor chileno Antonio Skármeta, escolheu Selton para dirigir a versão cinematográfica do livro “Um Pai de Cinema”. Se naquele trabalho de seis anos atrás o realizador tratou da temática paterna com um olhar de comédia e eventuais toques dramáticos, desta vez virou a chave, assumindo o drama intimista com ocasionais escapes cômicos.

O Filme da Minha Vida é o filme das memórias afetivas do narrador que revisita seu passado para refletir sobre os significados e valores de sua existência. O passado pode ser um velho filme preto e branco de John Ford, ou talvez uma velha Maria-fumaça percorrendo os trilhos de bucólicas paisagens. Estas são metáforas que evocam o passado do protagonista. Filho de pai francês (Vincent Cassel) e mãe brasileira, Tony Terranova (Johnny Massaro) é um jovem professor de francês no colégio de uma pequena cidade do interior na fronteira gaúcha. Um dia seu pai some de casa, abandona a família sem deixar nenhuma explicação. Enquanto sofre pela repentina ausência do pai, Tony precisa lidar com a passagem para a vida adulta. Seu grande companheiro de jornada, e ombro amigo nas horas difíceis, é Paco (Selton Mello), que faz às vezes a função de mentor e pai substituto. Enquanto aguarda o improvável retorno do pai, Tony se dedica às suas grandes paixões: o cinema, a poesia e as mulheres.


Filmado em locações na serra gaúcha, O Filme da Minha Vida exibe uma exuberante paisagem natural lindamente fotografada pelo mestre Walter Carvalho, esmero que também se verifica caprichada direção de arte que reproduz com riqueza de detalhes o modo de vida, os figurinos e os ambientes de uma pequena cidade do interior nos anos 60.

Neste novo trabalho Selton Mello volta a exibir um cinema sensível e poético, mais interessado em examinar personagens do que propriamente contar uma história. Algo que vai completamente na contramão da imensa maioria da produção do cinema nacional. Há, portanto, uma ambição artística que se manifesta num forte desejo do realizador em assegurar uma marca pessoal de estilo.


A pretensão estética é uma das fragilidades de O Filme da Minha Vida, que parece excessivamente preocupado em seduzir a sensibilidade do espectador a cada sequência, cena e enquadramento. Esta escolha do realizador em valorizar mais as partes em desfavor da integridade do todo resulta em sequências gratuitas e exibicionistas que pouco significam no contexto geral, particularmente do personagem Paco (uma egotrip do ator-diretor) com suas tiradas supostamente cômicas, frases de efeito e aforismos quase infantis. Isto sem falar em alguns personagens secundários mal resolvidos, como o garoto que quer conhecer a zona, a jovem miss, a mãe de Tony e até mesmo o próprio Paco, que não agregam em suas pequenas tramas paralelas, não chegam a lugar algum e somem da trama sem qualquer resolução.

O Filme da Minha Vida se ressente de um roteiro frágil e dispersivo que só encontra seu eixo no ato final. Selton Mello demonstra estar por demais apaixonado por seus personagens, a ponto de não dar a devida atenção à história do filme da vida deles.

Assista o trailer: O Filme da Minha Vida

Jorge Ghiorzi

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