quinta-feira, 4 de julho de 2019

“Instinto Selvagem”: paixão sem limites


INSTINTO SELVAGEM (Basic Instinct, EUA, 1992)
Direção: Paul Verhoeven
Elenco: Michael Douglas, Sheron Stone, George Dzundza, Jeanne Tripplehorn, Leilani Sarelle

Escândalo no Festival de Cannes de 1992, onde foi escolhido como o filme de abertura. Roteiro controvertido, adquirido pela cifra recorde de 3 milhões de dólares. Alvo da censura norte-americana, que obrigou os produtores a fazerem cortes na montagem final. Pretexto para passeatas da comunidade LGBT, que protestou contra o fato da personagem central (bissexual) ser suspeita de assassinato na trama. E, de quebra, o lançamento da estrela mais quente da temporada, Sharon Stone. Tudo isto antecedeu o lançamento de Instinto Selvagem, e foi com esta carga de informação – para o bem ou para o mal – que o filme chegou às telas de todo o mundo.

Típico produto hollywoodiano, com o peso da marca dos grandes estúdios, o filme reúne um explosivo coquetel que mistura violência, lesbianismo, investigação policial, psicologia e sexo, muito sexo. Resumindo: segue à risca a cartilha dos filmes que pretendem transitar entre a polêmica e o sucesso de bilheteria. Mais uma vez a fórmula deu certo. Com a curiosidade aguçada, mundo afora o público correu em massa para conferir de perto tudo que se dizia sobre Instinto Selvagem. O filme rendeu nada menos que 52 milhões de dólares em seus três primeiros fins de semana apenas nas telas americanas (*Nota: Levando-se em conta a correção monetária das últimas três décadas, este foi um valor muito significativo para a época).


O longa é um misto de filme se ação com suspense erótico e psicológico, onde o sexo e a atração sexual dos personagens tem importante papel. Tudo começa com o assassinato de um ex-astro do rock, já na violenta sequência de abertura. Então tem início a elucidação do crime pelo investigador da polícia Nick Curran (Michael Douglas, já escolado em filmes polêmicos, como Atração Fatal de 1987). As primeiras pistas são um picador de gelo com marcas de sague (a arma do crime), uma echarpe de seda amarrada à cabeceira da cama, e sinais de uma longa e turbulenta noite romântica.

As investigações indicam o envolvimento de três mulheres no caso. A primeira suspeita é Catherine Tramell (Sharon Stone), uma escritora de sucesso cujos assassinatos narrados em seus livros começam a acontecer na vida real. A outra suspeita é Roxy (Leilani Sarelle), a provocante e ciumenta namorada de Catherine. E por fim, a Drª Beth Garner (Jeanne Tripplehorn), uma psicóloga da polícia, com quem o próprio Nick costuma consultar. O investigador movimenta-se então em um território particularmente perturbador para suas convicções, especialmente as sexuais. A personagem mais fascinante da trama é a bissexual e sedutora Catherine, que afronta a polícia com seu comportamento ambíguo, arrogante e independente. Durante um depoimento ela é capaz de deixar os investigadores e policiais de boca aberta. Literalmente. Vestindo uma exígua minissaia, ela deixa bem claro que não é adepta do uso de calcinhas ao provocativamente cruzar as pernas diante de um bando de homens atônitos com a cena.


Para a altíssima voltagem erótica da cruzada de pernas (imagem símbolo do filme) foi decisivo o desempenho e a entrega de Sharon Stone, muito sedutora e sexy. “Fiquei fascinada pela personagem, especialmente pela sua falta de limites”, explicou a atriz. “Catherine é extremamente cruel e disposta a qualquer coisa a fim de atrair Nick para sua teia. Ela o seduz com a mente. Com sua sexualidade. E quando percebe que algo a cativa, fica ainda mais excitada”.

Dirigido por Paul Verhoeven (de Robocop e Vingador do Futuro) Instinto Selvagem mostra o poder da sedução que induz paixões cegas e destrutivas. O filme é basicamente uma história de amor inusitada e deformada. Apesar das inconsistências e furos do roteiro, que exigem a tolerância do espectador, a trama como um todo se mostra fascinante em suas armadilhas de sedução para também enredar o público.

Assista o trailer: Instinto Selvagem

(Texto originalmente publicado no jornal “Correio Lageano” (Lages – SC) / Agosto de 1992)

Jorge Ghiorzi

terça-feira, 2 de julho de 2019

“Gladiator – O Desafio”: lutando pela vida


GLADIATOR – O DESAFIO (Gladiator, EUA, 1992)
Direção: Rowdy Herrington
Elenco: Cuba Gooding Jr., James Marshall, Robert Loggia, Brian Dennehy

Por vezes o cinema consegue antecipar fatos que a realidade vem a confirmar posteriormente. Os recentes (1991/1992) conflitos de natureza racial que abalaram Los Angeles já haviam explodido antecipadamente nas telas. Filmes como New Jack City; Colors, As Cores da Violência; Os Donos da Rua e Faça a Coisa Certa abordavam, cada um a seu modo, aspectos diversos do contexto social e as tensões raciais no território norte-americano, situando de um lado os brancos e de outro lado todos demais, ou seja, os negros, hispânicos, asiáticos, etc.

Num ambiente com tantos conflitos raciais as explosões de violência já fazem parte do cotidiano. Neste aspecto o boxe, quando retratado pelo cinema, frequentemente é utilizado como um símbolo metafórico dos problemas sociais que afloram nos subúrbios das grandes cidades. Luta-se para (sobre) viver. Vive-se para lutar.


Tommy Riley (James Marshall, o motociclista do seriado Twin Peaks) é um boxeador do violento circuito das lutas clandestinas, onde o grande triunfo é sair vivo do ringue. A trajetória do jovem lutador é o tema central de Gladiator – O Desafio. Sem condições financeiras de continuar morando em um bairro classe média de Chicago, Tommy e seu pai são obrigados a mudar-se para um bairro degradado da metrópole. Lá o domínio é das gangues de rua, cujos membros também participam de lutas de boxe ilegais, organizadas pelo empresário Jimmy Horn (Brian Dennehy) que trata seus pugilistas como autênticos gladiadores modernos. A chegada de Tommy atrai a atenção do empresário, não só por suas habilidades, mas especialmente pelo fato dele ser branco, o que o coloca de imediato numa posição de adversário imediato dos demais lutadores negros e hispânicos. O dilema moral de Tommy Riley surge quando ele deve enfrentar no ringue o seu melhor amigo, o campeão (negro) Lincoln, interpretado por Cuba Gooding Jr., o protagonista de Os Donos da Rua.

Apesar das realistas e violentas cenas de luta, Gladiator – O Desafio se apresenta basicamente como um libelo contra a violência, uma denúncia à forma de vida dos jovens das áreas urbanas menos favorecidas, lutando pelo “pão de cada dia” enquanto sonham escapar da pobreza. “Tommy é como a maioria dos adolescentes”, afirma o diretor Rowdy Herrington. “Tem muita raiva dentro de si, mas também muito talento. O filme narra um rito de passagem, uma história na qual o protagonista encontra-se diante de um problema insolúvel, e ao resolvê-lo, torna-se homem.”

Assista o trailer: Gladiator – O Desafio

(Texto originalmente publicado no jornal “Correio Lageano” (Lages – SC) / Julho de 1992)

Jorge Ghiorzi