segunda-feira, 22 de setembro de 2025

Batman Eternamente: extravagância neon revisitada



Celebrando três décadas desde o seu lançamento, Batman Eternamente (Batman Forever), dirigido por Joel Schumacher, retorna às telas de cinema como um relançamento que mexe com nossas memórias. Não como uma joia esquecida, mas como um artefato peculiar de uma era audaciosa, por vezes desastrosa, do cinema de super-herói. O filme é, do primeiro ao último minuto, uma extravagância desmedida, um festival de exageros que beira o inacreditável. O tempo, longe de tê-lo redimido, apenas confirmou o que a crítica e o público já sabiam em 1995, pois trata-se de um equívoco criativo de proporções monumentais.

A tênue trama serve meramente como fio condutor para uma sucessão de cenas caóticas. O Batman (Val Kilmer) precisa enfrentar uma dupla de vilões: Duas-Caras (Tommy Lee Jones), um ex-promotor público desfigurado e obcecado, e o Charada (Jim Carrey), um gênio da tecnologia que lança enigmas mortais sobre Gotham City. Enquanto isso, o herói se vê atraído pela psiquiatra Dr. Chase Meridian (Nicole Kidman), que está igualmente interessada em estudar a mente do homem por trás da máscara. A narrativa é um mero pretexto para Schumacher mergulhar sua Gotham City em um oceano de luzes neon, roupas de couro e tomadas absurdamente amplas dos músculos do Batman.



É no campo das atuações, porém, que o filme atinge seus picos mais surreais de descontrole. Tommy Lee Jones, um ator de talento inquestionável, interpreta Duas-Caras com uma fúria tão desmedida e caricata que beira a paródia. Ele rosna, grita e espuma pela boca em cada cena, sem uma pitada da nuance trágica que o personagem merece. Jim Carrey, na esteira do sucesso explosivo de O Máskara, leva sua persona hipercinética ao extremo absoluto. Seu Charada é menos um gênio do crime e mais uma versão alucinada do seu personagem cômico Ace Ventura, se contorcendo e tagarelando em um ritmo frenético que cansa mais do que diverte. Juntos, eles formam uma dupla de vilões que não ameaça, mas simplesmente oprime os sentidos com seu excesso.


A receptividade na época foi relativamente mista, ainda que seus aspectos negativos tenham sido reconhecidos até pelos mais ferrenhos fãs do personagem. O público e a crítica estavam ainda apegados ao tom sombrio e gótico estabelecido por Tim Burton nos dois primeiros filmes. Batman Eternamente foi recebido como uma guinada brusca e barulhenta em direção ao camp e ao comercialismo puro. A saída de Burton e de Michael Keaton foi sentida profundamente, e a escolha de Joel Schumacher, cuja filmografia (Os Garotos Perdidos, Um Dia de Fúria) não sugeria afinidade com heróis mascarados, mostrou-se um erro crucial. O diretor admitiu ter se inspirado principalmente na série de TV dos anos 60, e isso explica tudo. A atmosfera é deliberadamente kitsch, uma celebração do absurdo que ignora completamente a complexidade do homem-morcego.


Reassistir ao filme 30 anos depois provoca um sentimento peculiar. A princípio, a avalanche de más decisões criativas ainda assusta. No entanto, visto através da lente da nostalgia e da condescendência que o tempo concede, Batman Eternamente ganha um charme acidental. Ele se torna um documento de sua época, um produto de estúdio desesperado para ser pop e vender brinquedos. É impossível não sentir uma ponta de lamento por Val Kilmer, um ótimo ator preso no meio desse furacão de mau gosto, tentando em vão trazer um pouco de seriedade a um set que mais parecia um circo. Batman Eternamente não é um bom filme, mas três décadas depois, sua falha catártica e honesta é, de uma forma estranha, mais digna do que os produtos calculados e sem alma que às vezes vemos hoje. É um erro glorioso, e como tal, merece ser lembrado.

Assista ao trailer: Batman Eternamente


Jorge Ghiorzi

Membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e ACCIRS (Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul)

Contato: janeladatela@gmail.com  /  jghiorzi@gmail.com

@janeladatela


sexta-feira, 19 de setembro de 2025

30 anos do PREVIEW: pioneira publicação de cinema de Porto Alegre


 

Em setembro de 1995, ano emblemático marcado pelas comemorações do centenário do cinema, foi lançado o primeiro número do Preview, uma publicação mensal dedicada ao universo da sétima arte. As edições eram distribuídas gratuitamente nas salas de cinema de Porto Alegre.

Em um período em que a internet ainda engatinhava e as fontes de informação eram escassas, o Preview se destacou como uma iniciativa pioneira no jornalismo cultural local voltado exclusivamente ao cinema. Com apenas quatro páginas, o informativo trazia notícias sobre lançamentos, curiosidades e matérias sobre os bastidores da indústria cinematográfica. Na época, cinéfilos e demais interessados dependiam quase exclusivamente de publicações impressas para acompanhar novidades e tendências do setor, entre elas as populares revistas Set e Cinemin, que dominavam o mercado editorial nacional nos anos 1990.



Criado e editado pelo jornalista e crítico de cinema Jorge Ghiorzi, o Preview , que a partir do 2º ano passou a se chamar Cine Guia Preview, teve 32 edições mensais entre 1995 e 1998, período que marcou seu primeiro ciclo de existência. Além de informar, a publicação também serviu como ponto de encontro para a comunidade cinéfila da capital gaúcha, antecipando tendências que mais tarde seriam amplificadas pelas redes sociais e pelos portais especializados.


Dez anos após seu encerramento, em 2008, o Cine Guia Preview iniciou um segundo ciclo, desta vez em formato digital. Convertido em newsletter quinzenal, passou a ser distribuído gratuitamente por e-mail a assinantes e teve seu conteúdo disponibilizado também no blog oficial. Com essa transformação, a publicação acompanhou a transição do jornalismo impresso para o ambiente online. Nessa nova fase, foram produzidas 41 edições até 2011, quando a publicação encerrou suas atividades de forma definitiva.

Alguns anos mais tarde, surgiu nas bancas de todo o país uma revista impressa editada por uma grande empresa do mercado nacional que adotou o mesmo nome, Preview, embora não tivesse qualquer relação com a publicação original porto-alegrense lançada em 1995.

Ao completar três décadas de seu surgimento, o Cine Guia Preview permanece como um marco da imprensa cultural do Rio Grande do Sul, lembrado como uma das primeiras iniciativas regionais dedicadas exclusivamente à cobertura de cinema e por ter dado voz e espaço à paixão pelo audiovisual em um período anterior à era digital.