Amplamente divulgado antes da estreia, os seis
minutos iniciais de Em Ritmo de Fuga (Baby Driver, 2017) funcionam como uma síntese
do que poderá ser assistido nos 110 minutos restantes. Está tudo lá: vilões
estilosos, carros velozes, manobras alucinantes, fugas espetaculares, montagem
empolgante, personagens cínicos, overdose de adrenalina e
trilha sonora de arrepiar. Apontado como uma das surpresas da temporada, o
filme de Edgar Wright (realizador de Todo
Mundo Quase Morto e Scott Pilgrim
Contra o Mundo) surge com o frescor de uma novidade mesmo que esteja
trilhando caminhos já tantas vezes utilizados em filmes de ação, tipo Velozes e Furiosos e outros tantos congêneres
de pouca grife. Não se trata evidentemente de uma reinvenção do modelo, mas com
certeza tem o mérito de oferecer uma repaginada no gênero que vinha há muito
tempo pecando pela repetição de uma fórmula reproduzida à exaustão.
O encanto do cinema pelas perseguições
automobilísticas vem de muito tempo. Desde a era do cinema mudo com os Keystone Cops os realizadores conhecem o
poder da energia cinética da velocidade das caçadas e fugas para seduzir as
plateias. Em Ritmo de Fuga segue esta
linhagem. Mas pisa no acelerador e avança um sinal. Sem olhar pra trás.
Após a abertura, já citada, sabemos que aquele
jovem que assume o volante do Subaru vermelho em fuga com assaltante a bordo,
após um roubo de banco, é habilidoso como poucos na direção, apesar da pouca
idade. Desligado do mundo ao redor, seus sentidos são impulsionados apenas pelo
rock furioso que ouve pelos fones de ouvido. O nome dele é simplesmente Baby,
interpretado por Ansel Elgort, conhecido por seu papel anterior em A Culpa É das Estrelas. A música
desempenha papel fundamental em todas as atitudes de Baby, e pontuam sua vida
em todos os momentos, esteja ou não em ação como piloto de fugas.
Um exemplo da presença ostensiva da música no DNA
do filme pode ser vista logo em seguida à cena inicial. Os créditos de abertura
foram construídos como um número musical que não ficaria feio em um La La Land, por exemplo. Pontuado por
uma versão da canção “Harlem Shuffle”, dos Rolling Stones, a abertura é um
criativo plano sequência pelas ruas de Los Angeles onde frases e palavras da
letra da música são exibidos parcial e discretamente em fachadas, letreiros e
luminosos, enquanto Baby, cheio de bossa, vai caminhando até uma cafeteria.
O jovem piloto, órfão de pai e mãe, trabalha para
um chefão do crime (Kevin Spacey) que nunca contrata o mesmo grupo de
criminosos para seus elaborados planos de roubos a bancos e agências dos
correios. Apenas Baby é fixo no grupo, graças a uma dívida do passado que o
garoto tem com o chefão. Dentre os parceiros de crime estão as figurinhas aterradoras
interpretas por Jamie Foxx e Jon Hamm (da série Mad Men). Preso a este compromisso de prestar serviço como piloto
de fugas, Baby não vê a hora de cair fora e viver uma despreocupada vida de
adolescente. E a situação fica ainda mais crítica quando ele descobre a paixão
de sua vida: uma doce e ingênua garçonete que desconhece sua vida dupla no
crime.
Em
Ritmo de Fuga apresenta
algumas das melhores perseguições automobilísticas já vistas nas telas. E olha
que a lista é grande e respeitável: Bullit;
Operação França; Viver e Morrer em Los Angeles; Ronin
e o recente Drive. A edição das
imagens frenética, porém não abusiva nem gratuita, segue o ritmo da trilha
sonora criando um ambiente sensorial extremamente empolgante. Edgar Wright foi
muito habilidoso em lidar com os elementos do filme de forma orgânica e crível,
sem o uso excessivo de recursos de computação gráfica.
Em relação aos personagens, a lamentar a subutilização
de Kevin Spacey. Ficamos na expectativa de que seu papel vá crescer na trama,
mas isto não se concretiza efetivamente. Quanto a Ansel Elgort sua assustada de
cara de bebê está bem adequada ao personagem, ainda que o papel não exija
grandes arroubos de interpretação, pois pouco interage com os demais (inclusive
é acusado de autista pelo personagem de Jamie Foxx). Baby só perde sua frieza e
ganha humanidade quando está em frente a sua namorada ou de seu mentor surdo e
mudo, uma espécie de pai adotivo, interpretado pelo simpático e cativante CJ
Jones.
Em
Ritmo de Fuga sai do lugar
comum para filmes de ação do gênero. É entretenimento de primeira classe e
diversão garantida. Senão pela trama, ou pelas eletrizantes sequências de
perseguição, com certeza pela trilha sonora que reúne mais de 40 canções,
muitos sucessos e algumas pérolas a serem redescobertas. Uma pena que a
distribuidora brasileira optou por um título tão genérico e pouco memorável. A
versão nacional perde toda a carga de significados que o título original
oferece.