
Em
um dia comum de aula, 17 crianças desaparecem misteriosamente. Elas se levantam
de suas camas, abrem as portas da frente e correm noite adentro, como se
obedecessem a um chamado invisível. Todas essas crianças pertencem à mesma
turma da terceira série de uma escola primária. Este é o ponto de partida A
Hora do Mal (Weapons), sem dúvida, perturbador e
irresistivelmente intrigante para os fãs de um bom suspense psicológico.
Dirigido com ousadia e criatividade por Zach Cregger, o filme transforma sua premissa em um verdadeiro quebra-cabeça narrativo. O roteiro se desenvolve de forma não linear, estruturado em capítulos de aproximadamente 15 minutos, cada um nomeado a partir de um personagem que ocupa o centro, ou a periferia, do mistério. À medida que cada peça é revelada, a trama se torna mais complexa e envolvente, revelando camadas cuidadosamente construídas.

No
centro da história está Justine Gandy, interpretada com intensidade e
vulnerabilidade por Julia Garner (da série Ozark, e também do elenco do
recente Quarteto Fantástico). Professora da turma desaparecida, Justine
chega à escola certa manhã e encontra apenas um de seus 18 alunos presente, o
tímido Alex, vivido por Cary Christopher. Tanto ela quanto o menino são
interrogados pela polícia, assim como o diretor da escola, Marcus (Benedict
Wong, de Doutor Estranho), mas as investigações encontram poucas pistas
concretas. As imagens das câmeras de segurança das casas das crianças revelam
algo ainda mais inquietante: elas não estavam fugindo de algo, mas sim correndo
em direção a alguma coisa ou a alguém. Completa o elenco de protagonistas o
ator Josh Brolin (de Vingadores: Ultimato, Deadpool 2 e Duna).
É
nesse clima de crescente estranheza que o filme mergulha, mais interessado em
construir uma atmosfera desconcertante do que provocar sustos fáceis. A Hora
do Mal é, muitas vezes, mais bizarro do que propriamente assustador, o que
pode frustrar parte do público acostumado a um terror mais convencional. No
entanto, para quem aprecia narrativas ousadas e atmosferas densas, o filme
oferece uma experiência hipnótica e inquietante.

A
trama avança com uma sensação de inevitabilidade sombria. Forças invisíveis
parecem manipular os personagens, levando-os a atos de extrema violência, muitas
vezes praticados pelos que aparentam ser os mais inofensivos. Somente no
penúltimo capítulo surge um novo personagem que lança uma luz reveladora sobre
os eventos, reformulando completamente o entendimento do espectador até então.

O
tom do filme, ao mesmo tempo grotesco e tragicômico, evoca ecos do cinema de
David Lynch, com sua justaposição de elementos surreais, domésticos e
perturbadores. Essa combinação se intensifica em seu trecho final, onde a
comédia ácida coexiste com cenas de violência explosiva e visceral, em um
clímax construído com habilidade.
O
elenco, comprometido e afinado com o tom singular da produção, sustenta com
solidez uma história que poderia facilmente resvalar para o absurdo. Julia
Garner, em especial, imprime humanidade e tensão à sua personagem, funcionando
como a âncora emocional de uma narrativa cada vez mais fragmentada e
alucinante.

Independentemente
de como se receba o desfecho, que mistura ironia sombria com um senso de
fatalismo cínico, é inegável que A Hora do Mal atinge um feito notável.
A narrativa transforma um conto aparentemente simples em uma distorcida
história de ninar, onde a inocência é corrompida e os monstros podem muito bem
estar dentro de nós.
Assista ao trailer: A Hora do Mal
Membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de
Críticos de Cinema) e ACCIRS (Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do
Sul)
Contato: janeladatela@gmail.com /
jghiorzi@gmail.com
@janeladatela
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