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quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Resistência: épico futurista e político

 


Nos primeiros 100 anos de existência do gênero Ficção Científica no cinema muitos ciclos temáticos se sucederam. Nos primeiros anos a base eram as adaptações de novelas de escritores visionários, como Jules Verne e H. G. Wells. Depois, nos anos 50, chegou a vez de explorar os medos do perigo atômico. Nos anos 60 o foco era a exploração espacial. Nos anos 70, as grandes utopias ganham as telas. Nos anos 80, as fantasias espaciais. Nos anos 90 veio a ressaca, com as distopias. Por fim, no novo milênio a bola da vez nos filmes de Ficção Científica é a onipresente Inteligência Artificial.

Resistência (The Creator, 2023), de Gareth Edwards (de Rogue One e Godzilla, de 2014) é mais uma produção que tem a IA como tema principal. No caso, não pelo o que ela possibilita de benefícios quase ilimitados, mas sim por seus efeitos negativos e danosos a longo prazo. O filme explora, de maneira dramática, as perigosas consequências que a utilização massiva desta tecnologia pode causar nos destinos da civilização.


Após explosão nuclear, que devasta Los Angeles, deliberadamente provocada por Inteligência Artificial, a tecnologia é banida e restrita no Ocidente. Apenas os países asiáticos ainda permitem a utilização da IA. Em meio a este mundo de opõe Ocidente x Oriente (algo tipo Guerra Fria), um ex-agente das forças especiais, Joshua (John David Washington), é recrutado para caçar e eliminar o Criador, responsável pelo desenvolvimento de uma poderosa arma que teria a capacidade de eliminar os humanos e conquistar o planeta. Joshua e sua equipe de agentes de elite atravessam as linhas inimigas e entram no coração sombrio do território ocupado pela IA para cumprir a missão. Lá descobrem que a poderosa arma secreta é uma criança, tecnologicamente construída, cujo destino pode alterar o rumo da guerra.


Resistência é um deslumbrante e original épico de ficção científica, apesar do tema central não ser exatamente uma novidade. O fato é que o filme apresenta várias camadas, o que já o coloca, de antemão, em um local de destaque na atual produção do gênero. Em sua face mais superficial se apresenta como uma movimentada aventura futurista. Há, porém, em seu subtexto, um interessante comentário político que aborda questões de xenofobia, colonialismo e expansionismo em países do terceiro mundo asiático. Isto sem falar no arco dramático do protagonista Joshua, que apresenta uma transição do homem belicista e violento até o humanismo e a empatia.


Visualmente o filme de Gareth Edwards é impactante, seja pelo desenho de produção criativo e original, seja pela fascinante cenografia. Contribuiu decisivamente para isto o fato de o filme ter sido realizado em grande parte em locações reais em países asiáticos, em substituição ao frio cenário verde de estúdio, utilizado na quase totalidade das produções do gênero. A pós-produção apenas adicionou elementos de computação gráfica sobre uma imagem captada em cenários reais. Isto faz total diferença para a verossimilhança e o resultado diferencial é visível.


Outro ponto a se destacar é a ausência do fetichismo pelos aparatos tecnológicos. Tudo que vemos tem função utilitária, e não está lá apenas pelo impacto estético que possa causar. Algo semelhante já vimos em Distrito 9, com aquela tecnologia “suja”, bastante convincente. Resistência optou acertadamente por este caminho. O roteiro, escrito por Gareth Edwards e Chris Weitz (de Um Grande Garoto e Pinóquio), é 100% original, algo raro em grandes produções, que costumam estar ancoradas em grandes referências de outras mídias, tipo livros, histórias em quadrinhos, séries, etc.


O nem tão admirável mundo novo apresentado por Resistência propõe analogias políticas muito identificadas com os tempos que vivemos. Este é o tipo de filme que as salas de cinema devem agradecer, especialmente neste momento de reconquista de público. Resistência é um filme cuja grandiosidade cênica e estética só são devidamente apreciadas na telona do cinema.

Assista ao trailer: Resistência


Jorge Ghiorzi

Membro da ACCIRS – Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul

Contato: janeladatela@gmail.com