O romance
histórico do francês Alexandre Dumas, Os Três Mosqueteiros (1844), é uma
das histórias clássicas mais adaptadas pelo cinema, a ponto de estabelecer um
gênero cinematográfico em si, o “capa-e-espada”. Desde os filmes mudos,
passando por desenhos animados, comédias e musicais, as aventuras de Athos,
Porthos, Aramis e D’Artagnan já ganharam muitas versões, interpretações e
releituras. Às vésperas de completar 280 anos o clássico de Alexandre Dumas
ganha mais uma versão, que chega às telas como uma das adaptações mais fiéis da
obra original, produzida na França, com cenários franceses, elenco francês e
diretor francês. Ou seja, uma autêntica produção com “lugar de fala”, legitimada
pela origem de todos os envolvidos.
Dirigido por
Martin Bourboulon (da comédia Relacionamento à Francesa e do drama
biográfico Eiffel) Os Três Mosqueteiros: D’Artagnan (Les
trois mousquetaires: D’Artagnan), na verdade é a primeira parte de um programa
duplo. A segunda parte, Os Três Mosqueteiros: Milady, será lançada no
final do ano.
Herói improvável,
D’Artagnan (François Civil) assume o protagonismo involuntário da história ao
se apresentar como o homem certo, na hora certa. Recém chegado à Paris, vindo
da Gasconha (sul da França) com a ambição de integrar o pequeno exército de
mosqueteiros, servidores leais do rei Luis XIII (Louis Garrel), o jovem e
impetuoso D’Artagnan se vê de imediato mergulhado no meio de ardiloso plano
para derrubar o reino. Aquele era um período de intensa disputa política que opõe
duas nações, França e Inglaterra, e duas religiões, Católicos e Protestantes. A
trama tem como vilã a sedutora Milady de Winter, interpretada por Eva Green,
que parece talhada para papéis desta natureza, e ganhará ainda mais destaque no
segundo filme da série.
O maquiavélico
Cardeal de Richelieu, em conluio com Milady, articula um complô para desacreditar
a rainha, revelando um caso de adultério que abalaria o reino. Mas, os Mosqueteiros
entram em ação cena, salvam a pele da rainha e garantem a unidade do abalado reino
do rei Luis XIII. A trama ganha contornos de suspense e emoção, que a aproximam
de uma investigação policial que sustenta as duas horas desta primeira parte da
narrativa.
As dinâmicas
sequências de ação e lutas são, no mais das vezes, empolgantes e vigorosas.
Duelos de espada aparecem em filmes desde os primórdios do cinema, mas, é fato,
pouco evoluíram em termos de coreografia e encenação ao longo dos últimos 100
anos. Neste aspecto há que se considerar que neste Os Três Mosqueteiros
há algo de novo que merece ser destacado. Não exatamente na coreografia, mas na
forma de gravar as lutas, quase sempre captadas com câmera baixa em leve contra-plongée
(de baixo para cima) e, o que faz toda diferença para transmitir uma sensação
de imersão e realismo (!), são mostradas em engenhosos planos-sequência (olha
aí John Wick fazendo escola).
Os Três
Mosqueteiros: D’Artagnan tem o mérito de fazer a releitura de um clássico,
respeitando sua origem, sem, no entanto, abrir mão de uma narrativa que busca o
ritmo de uma boa aventura que faça sentido às plateias atuais. Ponto negativo:
o filme certamente sofrerá um efeito de frustração pela falta de desfecho, como
Kill Bill, por exemplo, por ser dividido em duas partes lançadas com vários
meses de intervalo. Porém, com uma agravante, fruto do nosso tempo. O ritmo
ágil e descartável com que o audiovisual é consumido nos dias que correm, a
primeira parte deste Os Três Mosqueteiros poderá parecer velha e antiga
demais (talvez até mesmo esquecida) quando a segunda parte chegar aos cinemas
no final do ano.
Assista ao trailer: Os Três Mosqueteiros: D’Artagnan
Jorge Ghiorzi /
Membro da ACCIRS
janeladatela@gmail.com