quinta-feira, 25 de maio de 2017

"Westworld": perigos da tecnologia


O lançamento da série de TV Westworld, pela HBO, propicia a revisão do pequeno clássico cult dos anos 70, matriz da nova produção que chega às telinhas com status de superprodução, muita ambição e a assinatura da grife J. J. Abrams – Nolan.

Fruto da prodigiosa imaginação do prolífico escritor Michael Crichton (“Enigma de Andrômeda”, “O Homem Terminal”, “Sol Nascente”, “Assédio Sexual” e “Jurassic Park”), Westworld, o filme, foi lançado num período onde a ficção científica vivia um momento de alta no cinema. Ao especular o impacto da tecnologia na humanidade, a ficção científica na literatura discute a condição do homem em seu próprio tempo e sua perspectiva de futuro. O cinema, ao compartilhar esta visão - por vezes pessimista - de mundo, encontra o ponto de virada do gênero, rumo à maturidade, em 1968, quando Stanley Kubrick lança 2001 – Uma Odisseia no Espaço. A partir de então, o gênero poderia ir avante e além de um mero entretenimento descartável. Logo em seguida, em 1971, George Lucas vem com sua fábula distópica THX 1138.


Neste contexto Westworld, que no Brasil recebeu o inspirado subtítulo Onde Ninguém tem Alma, chega aos cinemas em 1973 com direção do próprio Michael Crichton, falecido em 2008. Cineasta bissexto, Crichton eventualmente se aventurou no cinema como diretor de filmes como O Primeiro Assalto de Trem, Coma e Runaway – Fora de Controle.

Em algum tempo de um futuro não muito distante, existe um paraíso na Terra. Com o nome de Delos, este paraíso é um parque de diversões para adultos, sonho de consumo de uma elite endinheirada. Sim, a diversão não é para todos os bolsos: 1.000 dólares por dia. O parque recria três universos distintos: o Mundo Romano, o Mundo Medieval e o Mundo do Velho Oeste. Todos habitados por androides de altíssima tecnologia, simulacros perfeitos do ser humano. O barato da brincadeira é vivenciar uma fantasia virtual propiciada por um cenário cuidadosamente preparado para aparentar uma ilusão de realidade. No Mundo Romano o “visitante” pode participar de banquetes orgiásticos regados com muito vinho e erotismo, no Mundo Medieval pode viver em Castelos usufruindo as delícias da Corte, ou, no Mundo do Velho Oeste pode virar caubói, cavalgar pelos vilarejos e, com alguma sorte, duelar com pistoleiros mal encarados, sem o risco de perder a vida. Essa é a grande sacada da diversão: os androides não podem, sob hipótese alguma, infligir mal ou qualquer dano físico aos visitantes do parque. Mas, a tecnologia, como uma boa ficção científica nos alerta, mesmo quando domesticada e massificada, não é infalível. Problemas ocorrem e as consequências podem ser devastadoras.


O encantamento com as possibilidades da ciência é a fonte primeira que inspira a ficção científica em narrativas literárias ou cinematográficas. As máquinas, que podem ser parte da solução dos problemas, invariavelmente são também apontadas como causadoras de novos problemas, desde a Revolução Industrial diga-se. Nasce aí o conflito central que baliza a história narrada em Westworld.

O filme de Crichton dá mostras de não ter resistido bem à passagem do tempo com sua produção um tanto modesta e precária (mesmo para a época). A narrativa é excessivamente lenta para os tempos atuais. No entanto, curiosamente, é justamente naquela estética típica dos anos 70 que reside parte de seu charme cult. A premissa, por demais interessante, seria revisitada pelo próprio Crichton anos depois ao criar Jurassic Park: um parque de diversões criado para o deleite (o paraíso), com tecnologia de ponta e o “demônio” da pane nas criações do homem quando brinca de deus (o inferno).


Imagem símbolo de Westworld, o pistoleiro assassino vivido por um improvável Yul Brynner (O Rei e Eu) certamente está na galeria dos mais icônicos androides / robôs da história do cinema. Sua vilania implacável e obstinada, guiada por assustadores olhos metálicos, domina a história, estando ou não em cena, transformando os protagonistas (interpretados por Richard Benjamin e James Brolin, pai de Josh Brolin) em meros coadjuvantes.

Três anos depois, em 1976, Westworld ganhou uma continuação malsucedida, chamada Ano 2003 – Operação Terra (Futureworld no original), estrelada por Peter Fonda.

(Texto originalmente publicado na coluna “Cinefilia” do DVD Magazine em outubro de 2016)

Jorge Ghiorzi

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