O primeiro filme solo da heroína dos quadrinhos
nasceu sob o signo da desconfiança. E razões não faltavam. A começar por ser
uma personagem da DC, que, convenhamos, não tem tido muita sorte (ou
competência) em suas adaptações cinematográficas. Outro fator de suspeição era o
histórico desfavorável das personagens femininas protagonistas no universo dos
super-heróis, quando chegam às telas. Quem não lembra dos fracassos monumentais
da Mulher-Gato e Elektra? Ou seja, havia muitos riscos envolvidos na primeira
aventura cinematográfica da Mulher-Maravilha. No entanto, apesar de todas as
adversidades potenciais que rondavam a produção, o filme se mostra um êxito
absoluto sob qualquer ângulo de análise, seja como entretenimento, seja pelas expressivas
bilheterias, seja pelas possibilidades de estabelecer, de maneira afirmativa, a
primeira franquia de real futuro da DC no cinema.
A exemplo do Capitão América (da Marvel), a Mulher-Maravilha
também é uma personagem fora de seu tempo. No caso da heroína, fora de seu
espaço também, pois abandona seu idílico mundo feminino na oculta ilha de Themyscira
para ingressar no mundo dos Homens (no sentido mais amplo da palavra) em plena
Guerra Mundial. Este é o primeiro conflito apresentado em Mulher-Maravilha (Wonder
Woman), o filme. A princesa amazona Diana Prince (Gal Gadot) é uma personagem idealista,
deslocada numa terra que desconhece, regida por regras e ambições
individualistas que custa a entender. A pureza de sentimentos e convicções
morais que cultua em sua civilização entra em choque com as fraquezas éticas e morais
de um mundo movido pelo ódio, ganância e luta pelo poder. A Mulher-Maravilha é
uma heroína do passado que resgata valores básicos de justiça, paz e harmonia,
muito bem-vindos nos dias que correm.
A ambientação no período da Grande Guerra oferece
um cenário perfeito para estabelecer o choque de realidade da Mulher-Maravilha,
que percorre sua jornada a partir de um idealismo quase inocente para uma
personagem que transita e sobrevive se adaptando ao meio ambiente hostil. Para
tanto enfrenta vilões bem humanos (incluindo uma vilã) e também adversários
mitológicos dotados de super poderes. Por tratar-se de um filme de origem, Mulher-Maravilha oferece o esperado
pacote completo, onde o arco da evolução da personagem é um tanto acelerado no
primeiro ato para dar conta de entregar uma super-heroína “pronta” para os atos
dois e três da aventura. Mas nada que comprometa significativamente o interesse.
Pelo contrário, aliás. A história é envolvente e cativa em poucos minutos. Afinal,
estamos diante de uma HQ transformada em filme, com todas as liberdades e
licenças artísticas que uma adaptação se permite fazer.
A direção de Patty Jenkins, a mesma de Monster – Desejo Assassino (com Charlize
Theron), é competente nas sequências de ação e sensível nos momentos mais
intimistas, recorrendo a pequenas piadinhas sexistas disparadas contra o
universo dos homens. Equilibradas e provocativas na medida, sem exagero,
diga-se, e totalmente afirmativas no terreno minado dos super-heróis, dominado
pelas figuras masculinas. Neste ponto, Mulher-Maravilha
ganha pontos preciosos e conquista merecido espaço para futuros projetos no
gênero.
Parte significativa dos acertos de Mulher-Maravilha deve ser creditada à
atriz Gal Gadot, que já havia estreado na pele da heroína no irregular Batman vs Superman: A Origem da Justica
em 2016. Ex-Miss Israel de 2004, e ex-integrante do exército israelense, Gal
Gadot encarna com paixão, garra e convicção a princesa amazona. Sua formação
militar fica evidente nas sequências de ação, quando sua figura cresce em cena ganhando
vigor e força nas coreografias. No entanto, fica um tanto a dever nos momentos onde
a personagem exige um pouco mais de talento dramático. Ainda assim, o saldo
final é positivo. Gal Gadot se apropriou definitivamente da personagem, e o que
vem daqui para a frente deverá fazer a alegria dos fãs.
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