O Formidável (Le redoubtable), dirigido por Michel Hazanavicius, é baseado no livro "Um Ano Depois" escrito pela atriz Anne Wiazemsky que relata sua relação com Godard, com quem foi casada por alguns poucos anos (após o fim do relacionamento do diretor com Anna Karina). O auge do romance ocorre durante o período das filmagens de A Chinesa, em 1967, às vésperas dos movimentos de Maio de 68. No papel de Godard está o ator Louis Garrel (num desempenho excepcional) conhecido por interpretar um dos jovens do trio central de Os Sonhadores, de Bernardo Bertolucci.
O retrato de Godard apresentado na obra de Anne
Wiazemsky, e por consequência no filme de Hazanavicius,
não é exatamente lisonjeiro, pelo contrário, revela uma pessoa extremamente
complexa, cuja convivência na intimidade estava longe de ser das mais agradáveis.
Polemista por excelência, o realizador francês não deixava barato nenhuma
discussão e comprava todas as brigas que estivessem ao seu alcance. Apontar
incoerências dos adversários – e da sociedade francesa em geral – era seu
esporte favorito. Enfim, um ranzinza de carteirinha em tempo integral, a 24
quadros por segundo.
Toda uma iconografia clássica de símbolos,
características dos filmes de Godard, estão presentes em O Formidável. Lá estão os reconhecidos créditos em letras vermelhas
e azuis, uma profusão de imagens de cartazes, placas e painéis de rua, e a referência
constante aos livros, especialmente aos populares policiais pulp. Além destas citações gráficas, que
remetem ao imaginário fílmico de Godard, o filme de Michel Hazanavicius por vezes emula também o clima de
alguns dos mais significativos trabalhos do diretor, como A Chinesa (por óbvio, pois retrata alguns bastidores da produção), O Demônio das
Onze Horas (Pierrot le fou), Week-end à Francesa, Made in U.S.A. e especialmente a
obra-prima O Desprezo, narrativa com
a qual espelha uma similaridade direta por narrar também a relação turbulenta de
um artista intelectual com uma estrela do cinema em ascensão, em meio a um permanente
embate entre a arte, a política e o capital.
O
Formidável oferece, com a devida excusa
pelo trocadilho, um formidável painel de uma época de intensa agitação política
e cultural, cujo ápice foram as manifestações e passeatas do movimento de Maio
de 68 nas ruas de Paris. Este episódio também foi rememorado em 2003 no já
citado Os Sonhadores, de Bertolucci,
realizador que também aparece em O
Formidável na recriação de um episódio polêmico onde Godard ofende e
desacata o diretor italiano, fato que resultou num rompimento dos dois.
Vencedor do Oscar de Filme e Diretor de 2012 com O Artista, Michel
Hazanavicius faz em O Formidável
um trabalho ainda mais inspirado e coerente, e, em muitos aspectos, superior ao
trabalho oscarizado. Não cai na tentação de referenciar em demasia a figura
mítica do seu conterrâneo, colega de profissão. Ao contrário, não se recusa a
expor todas as fragilidades e contradições de Jean-Luc Godard, cuja
personalidade egocêntrica transita da arrogância ao bom humor, do ativista radical
ao bom burguês num piscar de olhos. A tarefa arriscada e perigosa de retratar
uma personalidade pública ainda viva é, antes de tudo, uma ousadia, mas Hazanavicius sai ileso desta missão ingrata e realiza um filme que se assiste com imenso prazer. Para um cinéfilo o prazer é ainda maior.
O título do filme é uma referência
ao primeiro submarino nuclear francês, lançado no mesmo período em que se passam
os fatos narrados, que recebeu da imprensa local o apelido de “O Formidável”.
Pretendo ver ainda nesse final de semana
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