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quinta-feira, 29 de julho de 2021

“Tempo”: uma vida em um dia


Se há algo incontestável que se possa dizer sobre M. Night Shyamalan é que ele não tem medo de arriscar. Após o sucesso mundial de O Sexto Sentido, na virada do século, o cineasta de origem indiana poderia simplesmente se contentar com uma carreira confortável em Hollywood dirigindo apenas filmes convencionais com grandes estrelas, sob a grife dos grandes estúdios. O fato é que recusou a zona de conforto – apesar das acusações de se repetir nos filmes – optando por seguir a trilha de cineasta “autoral”, ou tão autoral quando possível no meio da indústria hollywoodiana. Um rebelde silencioso contra o sistema. Já cometeu sua cota de erros, vários, mas segue na convicção de seu cinema de gênero baseado essencialmente no suspense.

Após quase uma década de projetos frustrados, Shyamalan voltou a atrair atenção a partir de Fragmentado em 2016. Chegamos então ao 14º filme da sua filmografia, Tempo (Old, 2021), uma adaptação da graphic novel francesa “Sandcastle” (Castelos de Areia), de Pierre Oscar Lévy e Frederik Peeters. E para não deixar dúvidas, suas marcas registradas estão todas lá: suspense, mistério, reviravoltas e maneirismos narrativos. Para o bem e para o mal.


Um casal (Gael Garcia Bernal e Vicky Krieps) e seus dois filhos pré-adolescentes em viagem de feriado se hospedam em um resort de verão. Lá são convencidos a conhecer (juntamente com outros hóspedes) uma praia isolada de difícil acesso. A promessa de aventura, descanso e diversão se transforma em tragédia ao ficarem presos, incomunicáveis e sob um estranho efeito. Naquele local misterioso o tempo transcorre mais rápido, fazendo com que todos envelheçam em poucas horas vários anos de vida.


O grande inimigo de Tempo é, ironicamente, o tempo. A maior parte da trama parece um episódio estendido do seriado Lost, onde uma situação básica é estabelecida e permanece rodando sem sair do lugar, acrescentando acúmulo de informações e pistas por todo lado. O que inicia com uma criativa e bem trabalhada inquietude aos poucos se transforma em tedioso incômodo. A premissa muito promissora parece não entregar tudo o que prometia, parecendo se contentar apenas com os aspectos superficiais de uma história de fundo fantástico e perturbador. O que, de modo geral, é uma falha recorrente em vários filmes de Shyamalan, onde ele costuma perder a mão. Seu cinema privilegia excessivamente a forma em detrimento do conteúdo. Ele é um cineasta esteta que se manifesta primordialmente pelo aspecto visual. Mais do que o que contar (narrar) Shyamalan se esmera primeiramente na forma visual do que será mostrado. Isto explica o uso frequente de enquadramentos inusitados e profundidade de campo nas tomadas. Artifícios da linguagem e da técnica cinematográfica utilizados com grande habilidade e virtuosismo, diga-se a bem da verdade.


Com Tempo Shyamalan parece se deparar com um impasse. Indeciso entre uma história de terror ou drama psicológico que reflete a inevitabilidade da morte, o realizador abre mão de mergulhar profundamente no tema, fazendo a opção fácil por uma trama centrada apenas no horror corporal. Um roteiro frouxo, superficial e pouco conclusivo não dá conta de amarrar todas as pontas levantadas ao longo da história. Personagens avulsos, que pouco fazem sentido ou se conectam convincentemente quando juntos, não ajudam a atrair a atenção ou empatia da plateia. Isto sem falar do elenco internacional que não dá liga em momento algum. No ranking que vai do melhor (O Sexto Sentido) ao pior (Fim dos Tempos) desta vez Shyamalan ficou no meio do caminho.

Assista ao trailer: Tempo

por Jorge Ghiorzi