Se há algo
incontestável que se possa dizer sobre M. Night Shyamalan é que ele não tem
medo de arriscar. Após o sucesso mundial de O
Sexto Sentido, na virada do século, o cineasta de origem indiana poderia
simplesmente se contentar com uma carreira confortável em Hollywood dirigindo
apenas filmes convencionais com grandes estrelas, sob a grife dos grandes
estúdios. O fato é que recusou a zona de conforto – apesar das acusações de se
repetir nos filmes – optando por seguir a trilha de cineasta “autoral”, ou tão
autoral quando possível no meio da indústria hollywoodiana. Um rebelde
silencioso contra o sistema. Já cometeu sua cota de erros, vários, mas segue na
convicção de seu cinema de gênero baseado essencialmente no suspense.
Após quase uma década de projetos frustrados, Shyamalan voltou a atrair atenção a partir de Fragmentado em 2016. Chegamos então ao 14º filme da sua filmografia, Tempo (Old, 2021), uma adaptação da graphic novel francesa “Sandcastle” (Castelos de Areia), de Pierre Oscar Lévy e Frederik Peeters. E para não deixar dúvidas, suas marcas registradas estão todas lá: suspense, mistério, reviravoltas e maneirismos narrativos. Para o bem e para o mal.
Um casal (Gael Garcia Bernal
e Vicky Krieps) e seus dois filhos pré-adolescentes em viagem de feriado se hospedam
em um resort de verão. Lá são convencidos a conhecer (juntamente com outros
hóspedes) uma praia isolada de difícil acesso. A promessa de aventura, descanso
e diversão se transforma em tragédia ao ficarem presos, incomunicáveis e sob um
estranho efeito. Naquele local misterioso o tempo transcorre mais rápido,
fazendo com que todos envelheçam em poucas horas vários anos de vida.
O grande inimigo de Tempo é, ironicamente, o tempo. A maior
parte da trama parece um episódio estendido do seriado Lost, onde uma situação básica é estabelecida e permanece rodando
sem sair do lugar, acrescentando acúmulo de informações e pistas por todo lado.
O que inicia com uma criativa e bem trabalhada inquietude aos poucos se transforma
em tedioso incômodo. A premissa muito promissora parece não entregar tudo o que
prometia, parecendo se contentar apenas com os aspectos superficiais de uma
história de fundo fantástico e perturbador. O que, de modo geral, é uma falha recorrente
em vários filmes de Shyamalan, onde ele costuma perder a mão. Seu cinema
privilegia excessivamente a forma em detrimento do conteúdo. Ele é um cineasta esteta
que se manifesta primordialmente pelo aspecto visual. Mais do que o que contar
(narrar) Shyamalan se esmera primeiramente na forma visual do que será
mostrado. Isto explica o uso frequente de enquadramentos inusitados e profundidade
de campo nas tomadas. Artifícios da linguagem e da técnica cinematográfica utilizados
com grande habilidade e virtuosismo, diga-se a bem da verdade.
Com Tempo Shyamalan parece se deparar com um impasse. Indeciso entre
uma história de terror ou drama psicológico que reflete a inevitabilidade da
morte, o realizador abre mão de mergulhar profundamente no tema, fazendo a
opção fácil por uma trama centrada apenas no horror corporal. Um roteiro
frouxo, superficial e pouco conclusivo não dá conta de amarrar todas as pontas
levantadas ao longo da história. Personagens avulsos, que pouco fazem sentido
ou se conectam convincentemente quando juntos, não ajudam a atrair a atenção ou
empatia da plateia. Isto sem falar do elenco internacional que não dá liga em
momento algum. No ranking que vai do melhor (O Sexto Sentido) ao pior (Fim
dos Tempos) desta vez Shyamalan ficou no meio do caminho.
Assista ao trailer: Tempo
por Jorge Ghiorzi