A caça aos tesouros
de ouro, base de muitas aventuras da literatura clássica e filmes de matinê da
primeira metade do século XX, segue inspirando a imaginação dos roteiristas.
Há, sem dúvida, um toque de nostalgia ao se resgatar este tipo de temática para
o cinema do novo milênio. Um mundo onde o ouro, objeto cobiçado por 10 entre 10
exploradores de tesouros, já nem representa mais a melhor forma de conquistar
fortunas no limite da ilegalidade. Um golpe com moedas criptografadas, ou saques
virtuais de contas bancárias, por exemplo, seria bem mais fácil, rápido e “seguro”.
Mas, reconheçamos, é um tanto sem graça. Onde ficaria a adrenalina da aventura?
Dito isto,
chegamos a Uncharted – Fora do Mapa (Uncharted), dirigido por Ruben
Fleischer (de Zumbilândia 1 e 2, Caça aos Gângsteres e Venom), uma aventura de ação que pretende
reviver o clima dos antigos filmes de sessão da tarde, com a roupagem, a
estética e o ritmo acelerado do cinema contemporâneo. A origem de Uncharted é bem menos nobre, pois não vem
da literatura tradicional, mas sim do universo dos videogames. Trata-se de uma
versão live action de uma série de
muito êxito da Sony / PlayStation.
O esperto barman Nathan “Nate” Drake (Tom
Holland), perito em pequenos golpes, é recrutado pelo caçador de tesouros
Victor “Sully” Sullivan (Mark Wahlberg) para recuperar uma fortuna em ouro perdida
há 500 anos, que valeria alguns bilhões de dólares. O que começa como um golpe,
acaba se tornando uma aventura épica que se estende pela Europa e Ásia para
alcançar o tesouro antes do implacável vilão espanhol, Santiago Moncada
(Antonio Banderas), que acredita que é o herdeiro legítimo da fortuna. Se Nate
e Sully forem capazes de decifrar as pistas para resolver um dos mistérios mais
cobiçados do mundo, eles podem encontrar o tesouro e talvez até o paradeiro do
irmão de Nathan, há muito tempo desaparecido.
A série Uncharted já conta com quatro volumes de jogos para as plataformas digitais. Para a adaptação a opção dos produtores foi não realizar um filme de origem, mas uma aventura que trouxesse elementos de vários dos jogos e expandisse seu contexto para a mídia cinematográfica. A preocupação era assegurar que o público não tivesse a necessidade de conhecer os jogos para acessar o universo do filme. Outra importante decisão do diretor Ruben Fleischer foi filmar preferencialmente (tanto quanto possível) em locações e sets construídos, ao invés de gerar tudo por computação gráfica, como é bastante comum. Cenários reais efetivamente trazem vida para a tela e tornam mais tangível o mundo da narrativa. Então, ponto para Uncharted neste quesito.
A dupla central
Holland – Wahlberg funciona muito
bem, deu liga como se diz. Já o mesmo não se pode dizer da coprotagonista Sophia
Taylor Ali, que fica muitos pontos abaixo, destoa do clima geral e fica muito a
desejar. Sua personagem, Chloe Frazer, é praticamente nula e irrelevante para o
andamento da trama. No quesito participação de prestígio, Antonio Banderas
tenta dar um ar de sofisticação ao vilão espanhol, mas parece estar em cena apenas
para garantir um nome forte no pôster do filme, já que sua presença também
pouco se justifica, não diz a que veio e pouco (ou nada) acrescenta à aventura
de caça ao tesouro.
Exploradores em
busca de relíquias históricas remetem inevitavelmente à figura icônica de
Indiana Jones, a quem Uncharted
reverencia e bebe na fonte em algumas sequências. Inclusive com uma breve
citação literal ao nome do clássico personagem criado pela dupla Spielberg –
Lucas há 40 anos (!), criando um momento curioso onde a ficção invade a ficção.
Outra referência que o filme traz à memória é a aventura estrela por Nicolas
Cage em 2004, A Lenda do Tesouro Perdido.
Uncharted – Fora do Mapa sofre da sina que
costuma assolar a imensa maioria dos filmes adaptados de videogames. A sensação
imersiva de um jogo digital costuma se perder quando reproduzida na tela
grande. E não foi diferente aqui. A solução encontrada pelos roteiristas (a já
citada utilização de partes de histórias de jogos diferentes) fragmenta por
demais a narrativa e compromete a coesão. Parece estarmos diante de um roteiro
escrito por inteligência artificial através de algoritmos. Está tudo ali, os
personagens, a trama, o conflito, mas, algo não funciona em plenitude nesta
experiência de gamificação. O saldo, não mais que mediano, talvez assegure uma
sequência. Uma cena pós-crédito sugere isto. Que tenha mais sorte, ou
competência, na próxima vez. Caso contrário, game over.
Assista ao trailer: Uncharted – Fora do Mapa
Jorge Ghiorzi
Membro da ACCIRS
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