A nova animação
da DreamWorks reúne dois temas que estão na ordem do dia: tecnologia e meio
ambiente. Robô Selvagem (The Wild Robot, 2024) é uma fábula que
consegue a proeza de dialogar simultaneamente com o intocável universo da vida
selvagem e as possibilidades ilimitadas da utilização da Inteligência
Artificial na evolução da civilização humana sobre o planeta. O resultado é uma
das mais emocionantes e tocantes animações dos últimos anos, superando com
larga vantagem a animação da Disney Pixar lançada em 2008, WALL-E, com a
qual possui alguma semelhança temática.
A história inicia
com um acidente que joga uma robô – a unidade ROZZUM 7134, ou apenas “Roz” – em
uma remota e desabitada ilha. Naquele ambiente desconhecido a unidade robótica
necessita se adaptar e aprender as regras de sobrevivência, enquanto aguarda
por resgate. Neste processo Roz descobre os mecanismos que regem a flora e a
fauna local. Aos poucos desenvolve uma relação de amizade e cumplicidade com
Bico-Vivo, um filhotinho de ganso órfão que precisa aprender a voar, e Astuto, uma solitária e ardilosa
raposa.
O elemento humano
é um sujeito oculto em Robô Selvagem, pois não aparece objetivamente em
cena. Apenas são percebidos e identificáveis, de maneira indireta, os reflexos
e as consequências da sua existência. A Natureza profunda, intocada pelo
“homem”, inadvertidamente se transfigura pela presença surpresa de um robô de
alta tecnologia que literalmente cai do céu para romper o equilíbrio do
ambiente de um ecossistema inexplorado e virgem (sob o ponto de vista humano).
Uma subversão da ordem natural das coisas é a consequência imediata desta
invasão involuntária. Daí surge uma história inspiradora com forte componente emocional
que transmite lições de vida, civilização, família e empatia.
Os primeiros
momentos de Robô Selvagem são vacilantes, parecem um tanto rotineiros e
a animação não diz exatamente a que veio. Funcionam essencialmente para
estabelecer o contexto e apresentar os “personagens” principais. No entanto,
logo a animação encontra seu eixo narrativo e conquista definitivamente o
interesse do espectador. Passamos a acompanhar com interesse genuíno o destino
do improvável trio de protagonistas: a robô (mãe), o bebê ganso e a raposa.
A animação,
dirigida por Chris Sanders (o mesmo de Lilo & Stitch e Como
Treinar seu Dragão), faz uma espécie releitura do conto de fadas “O Patinho
Feio” de Hans Christian Andersen, atualizado para temas como inclusão,
representatividade de papeis e liberdade para exercer o direito de ser
diferente em meio a hegemonia social, no caso específico do filme, em meio ao
reino animal. O foco desta vez não está na figura do filhote em busca de
acolhimento, mas sim na figura da robô que encarna uma mítica “mãe coragem”,
que assume o papel de provedora e protetora. Com estes elementos o roteiro
desenvolve uma emocionante jornada de autoconhecimento, tolerância e
sobrevivência dos integrantes de uma família disfuncional, reunida por
circunstâncias aleatórias em ambiente hostil.
O gregarismo dos
animais é, sob certa ótica, colocado em risco pela presença intrusa de um
elemento externo que desiquilibra a harmonia ancestral do ambiente. Pois é
justamente aí que ocorre o grande fato transformador, exemplar como simbologia,
que promove uma necessidade colaborativa entre as espécies, subvertendo o
instinto natural de preservação pela convivência entre os iguais. A mente
cibernética da robô Roz não estava programada para interagir e muito menos se
ocupar dos problemas das diversas espécies de animais que encontrou naquele
ambiente. Ainda assim, sua inteligência superior foi tocada de alguma maneira
pelos problemas de sobrevivência e os ciclos da vida aos quais os seres vivos
são submetidos. Neste ponto a inteligência artificial foi substituída pela
inteligência emocional, que despertou sentimentos que a máquina desconhecia até
então.
Temas atuais como
a preservação da natureza e a sustentação da vida estão presentes como forças
vitais que sustentam a narrativa. O componente emocional, presente ao longo de
todo o filme, aliado ao carisma das personagens centrais, cativam o espectador
do início ao fim. Robô Selvagem é uma diversão exuberante para todas as
idades. O resultado é uma experiência de cores e movimentos que proporciona uma jornada divertida, sensível e criativa. Robô Selvagem chegou para
rivalizar com Divertida Mente 2 como a melhor animação de 2024.
Assista ao trailer: Robô Selvagem
Jorge Ghiorzi
Membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de
Críticos de Cinema) e ACCIRS (Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do
Sul)
Contato: janeladatela@gmail.com /
jghiorzi@gmail.com
@janeladatela