Abram caminho no
trânsito. Lá vem a ambulância. A bordo, um policial ferido e uma socorrista. No
volante, dois assaltantes em fuga. No comando, um cineasta movido à adrenalina
aditivada: Michael Bay. Esta poderia ser uma sinopse minimalista de Ambulância
– Um Dia de Crime (Ambulance), a eletrizante versão estadunidense de um
filme de ação dinamarquês lançado em 2005. Porém, de minimalista não temos
nada. Tudo é over e superlativo,
afinal, estamos falando de Michael Bay.
E é justamente pela
visão do realizador que se inicia a análise deste vertiginoso thriller de
assalto a banco. Há ali, de maneira flagrante, uma assinatura, um estilo de
filmar, um modo de injetar vertigem na narrativa, sem dar trégua ao espectador.
Não se trata de uma forma esporádica de filmar. É uma tradição recorrente que
se reafirma, filme após filme, desde Os
Bad Boys, A Rocha e Armageddon, nos anos 90, até Transformers, Sem Dor, Sem Ganho e 13
Horas: Os Soldados Secretos de Benghazi, nos anos 2000. Então, sim, para
Michael Bay a forma se impõe decisivamente sobre o conteúdo.
Posto isso, vamos
ao que interessa. O “rei das explosões” está de volta, desta vez com uma veloz
e furiosa Ambulância como uma das “personagens”, que entra por azar no centro de
um malogrado assalto a banco. Os autores do roubo são dois irmãos (um deles
adotivo). Danny (Jake Gyllenhaal) é um criminoso profissional, reconhecido pela
ousadia e inteligência. Will Sharp (Yahya Abdul-Mateen, do recente Matrix Ressurectons), seu irmão, é um
ex-combatente do Exército norte-americano, em dificuldades financeiras para
bancar a cirurgia da esposa. Ao pedir ajuda ao irmão, Will é convencido por
Danny a participar do grupo que vai assaltar um banco em busca de 32 milhões de
dólares (isso, dinheiro físico, cédulas). O roubo, que parecia fácil, dá errado
e a dupla escapa da cena do crime sequestrando uma ambulância que está no local
para atender os feridos do intenso tiroteio.
Em se tratando de filme
de Michael Bay, a formatação clássica dos três Atos sofre uma sensível
distorção dos cânones hollywoodianos. Temos dez minutos expositivos no primeiro
Ato, seguidos de frenéticos 90 minutos no segundo Ato, e por fim rápidos três
minutos de desfecho no terceiro Ato. É papo reto.
Diferente de Velocidade Máxima (1994), com o qual
guarda alguma semelhança pelo mote da perseguição implacável, com alguma
surpresa podemos identificar que em Ambulância
– Um Dia de Crime o diretor vai um pouquinho além (bem pouco, diga-se) demonstrando
alguns sinais vitais em seus personagens principais. Isso mesmo, há vidas reais
por trás daqueles personagens, mas nada que roube a cena a ponto de distrair a
plateia para a essência da caçada motorizada pelos subúrbios da ensolarada Los
Angeles. Neste aspecto se destaca a socorrista Cam Thompson, vivida pela
mexicana Eiza Gonzáles (Em Ritmo de Fuga
e Velozes & Furiosos: Hobbs &
Shaw), que apresenta um arco de personagem que a transforma ao longo da
narrativa. A Cam Thompson do inicio do filme não é a mesma do final, após o desfecho
do episódio da perseguição. O coração do filme está em suas mãos, no sentido
figurado e literal. O cinema da testosterona de Bay dá ainda sinais que se
atualiza aos novos tempos de diversidade: um dos agentes do FBI tem um
relacionamento homoafetivo.
A natureza nos
impõe algumas leis irrevogáveis, mas não para Michael Bay. Para ele a Lei da
Gravidade simplesmente não existe. Além disso, a energia cinética dos seus
veículos em movimento parece desafiar a Física que se conhece. Tudo em nome do
espetáculo, e que espetáculo! Algumas das sequências ensandecidas das
perseguições (e dos tiroteios também) são no mais das vezes empolgantes. A
utilização de drones nas tomadas está cada vez mais desenvolvida, e o diretor
faz um excelente trabalho utilizando esta técnica de captação do movimento
real.
A edição frenética
e a câmera instável também estão presentes, um cacoete que Michael Bay trouxe dos
diversos videoclipes musicais que dirigiu antes de entrar para a carreira de
diretor de cinema. Nestes aspectos visuais Bay traz alguns traços de semelhança
com o trabalho do precocemente morto Tony Scott, que tinha o hábito (amuleto?)
de utilizar um surrado boné rosado durante as filmagens. Curioso que em Ambulância um dos personagens (líder da
equipe do FBI) utiliza também um surrado boné com esta cor. Caso tenha sido uma
homenagem intencional, foi bem-vinda.
Ambulância – Um Dia de Crime não reinventa a
roda, mas dá fôlego para um gênero de filme de ação que parecia não empolgar
mais as plateias pela repetição ad
infinitum da fórmula (está aí a franquia Velozes & Furiosos, testando os limites da paciência do
público). Aqui estão, lado a lado, o melhor e o pior de Michael Bay. Ao equilibrar-se
entre a megalomania e a pieguice, ele até se permite a fazer piadinhas autorreferentes
com dois de seus maiores sucessos, A
Rocha e Os Bad Boys. Agora, vamos
aguardar seu novo projeto, uma ficção científica chamada Robopocalypse.
Assista ao trailer: Ambulância – Um Dia de Crime
Jorge Ghiorzi
Membro da ACCIRS